Preto, a mais linda flor a se cheirar

Fatalmente e infelizmente um dia acontecerá com você. Em algum momento da sua vida alguém contará uma daquelas piadas racistas e preconceituosas que circundam o mundo dos fracos. Lembro que quando era criança alguém me perguntou se eu já tinha visto flor preta. Respondi, sem pensar, que não. A inevitável resposta “é que preto não é flor que se cheire” veio na sequência e deixou-me, além da indignação, uma dúvida que carreguei por anos. A verdade é que mesmo sabendo que se tratava de algo muito grave, nunca saí do âmbito flora da questão e durante muito tempo questionei-me sobre a existência de uma flor negra. O fiz em aulas de biologia, pesquisei em enciclopédias, fossei, sem sucesso, aqui e acolá. Eis que, com o advento da internet até encontrei algumas fotos, mas nada palpável.

Aos poucos a chama da curiosidade se apagou, até que eu, em “meu” filosófico jardim, por uma questão de falta de pessoal, fui selecionado para cuidar das flores. Normalmente permaneço no âmbito das leguminosas e pouco passeio pelos canteiros floridos, mas desde fevereiro esse mundo desconhecido, escondido entre a casa de vidro e o túnel de lona, se abre para mim e, tudo o que plantei, agora floresce.

O encantador nisso tudo é que eu não tinha ideia do que havia plantado. A conjunção entre os nomes e o vir-a-ser de cada flor ocorre paulatinamente na medida em que elas desabrocham. Narcisos, amores-perfeitos, gerânios e por fim, a petúnia negra (por quem me apaixonei). Seu cheiro é suave, envolve na medida certa, é doce e vicia. Quem a tem poderia cheirar seu negrume uma vida inteira sem enjoar. Por isso lhes digo que o preto tornou-se, para mim, a mais linda flor a se cheirar…   

Foto da minha petúnia negra