Etiquetas

Minha excêntrica e enorme família produz, num único dia, mais de trinta quilos de roupa suja. Somos, ao todo, vinte e cinco pessoas morando sob um único teto.

Ali pelas oito da noite, depois das crianças dormirem, desço até o submundo da casa Jawlensky (como vocês sabem, é o nome da casa onde eu moro). No finzinho do porão, depois do quarto das máquinas, da despensa das bebidas, do quarto dos frigoríficos, da estalagem onde moram meus porquinhos da Índia, adentro em nossa lavanderia.

Os cestos estão, normalmente, cheios. Eu sorteio as peças. Lã, algodão, viscose, linho, roupa colorida, roupa clara, etc. Cada indumentária é um objeto único e necessita ser lavado como tal.

Para separar tudo corretamente é necessário ler minuciosamente as indicações contidas nas etiquetas.

A cada etiqueta, um mundo a ser descoberto… A temperatura ideal de lavagem: 30, 40, 60 ou 95 graus. Pode-se utilizar produtos à base de cloro? Como é com a secadora? É possível passar à ferro? Enfim, meras informações técnicas, mas com enorme efeito.

Confesso que no começo eu confiava na minha intuição. Simplesmente me recusava a ler.  Com o passar do tempo, fiquei sem calças e as cuecas que eu conseguia vestir transfiguraram-se em cuecas fio-dental. Mas como escreveu Sartre… O inferno são os outros! Com tantos encolhimentos e tingimentos involuntários, minha família se rebelou e passou a querer meu couro. Bom, antes de ser, como Adão (que por sorte não necessitava de vestimentas) expulso do paraíso, passei a ler as ditas.

Hoje, como sempre, já joguei algumas dezenas de camisetas, calças e moletons nas lavadoras. A Luz pálida não inibe minha sonolência e lentidão. O tédio me consome. As etiquetas não trazem nada de novo. Uma delas, no entanto, faz eu romper a inércia, tira-me da modorra na qual estou submerso…

 

Apenas lavar a frio.

Não secar na secadora.

Não passar a estampa.

Jamais bater em Pandas.

A vida e as suas surpresas.