A Praia de Navegantes… O nosso Caribe

O verão está a bater em nossos portais. As temperaturas estão a alcançar os trinta graus centígrados; porta-malas abrem as suas bocas, prontos para receber as bagagens de fim de ano. É possível até sentir o cheiro salso da maresia na Cidade mais Alemã do Brasil.
Quando eu era pequeno passávamos, enquanto família, uma única semana no litoral.
A praia de navegantes era o nosso Caribe. Quantas expectativas, sonhos e alegrias estavam atrelados aqueles dias tragicômicos.
A casa emprestada era de madeira, o terreno pequeno e arenoso, uma cerca de arame farpado delimitava o espaço. Gaivotas planavam, piavam e soltavam cocôs em pleno voo. Uma brisa leve e gostosa soprava sem intervalos comerciais. Tudo isso encantava a minha alma e apetecia os meus sentidos.
Dentro da casa, móveis antigos aglutinavam-se. Tudo sem o menor sentido estético, aliás, essa era a real beleza do lugar. A televisão colorida gigante, com quadro de madeira e botão giratório que fazia clac, clac, clac… O Sofá de couro surrado, a geladeira azul-calcinha entupida de imãs. Aliás, aqueles imãs eram um ancestral do Google. Ali havia todas as informações necessárias à vida praiana. Pizzaria Bella Donna, PróGás, Farmácia do Luiz, etc…
O fogão enferrujado, a torneira preta de plástico, o vaso sanitário de louça verde com tampa de PVC marrom, além dos azulejos, uns diferentes dos outros e devidamente assentados sem lógica. Os quartos eram entupidos de beliches e os colchões tão velhos e moles que, se alguém dormisse ali mais do que duas semanas, certamente tornar-se-ia sócio de uma clínica ortopédica.
Do lado de fora uma reta, feita de cascalho arenoso cheia de buracos, se estendia até o horizonte.
Para se chegar a praia era preciso andar “toda a vida reto”, atravessar uma avenida, passar por uma restinga e, então, a infinitude do Oceano Atlântico em ondas médias nos convidava a brincar de jacaré até não poder mais, quer dizer, até a oma destruir o sonho com seus argumentos pouco científicos.
Para ela, água somente até a altura dos joelhos, caso contrário o repuxo me sugaria e eu desapareceria sem deixar vestígios, como um navio a cruzar o Triângulo das Bermudas.
O meu tempo na praia era dividido pela oma em 10% mar e 90 % embaixo do guarda-sol, pois, segundo ela, eu “pegaria” câncer na cabeça ou o sol cozinharia o meu cérebro, tal como aconteceu com o neto da Trudi sua amiga, possivelmente, imaginária.
Foi ali, meus amigos, que aprendi a ser feliz em uma sombra de cinquenta centímetros de diâmetro.
Para a mãe, os monstros eram os bichos do pé que rondavam as cercanias da casa. Caminhar por ali somente com chinelo de dedo, caso contrário os berros histéricos de mamãe alcançariam o aeroporto.
– PÕE O CHINELO! QUANTAS VEZES TENHO QUE TE FALAR! OLHA OS BICHOS DO PÉ, MEU FILHO.
À noite, ou éramos comidos pelos mosquitos, ou aguentávamos o cheiro do SPB, terrível contra os insetos e, lógico, contra os nossos pulmões.
Enfim, aqueles dias contentes passaram, a oma morreu e eu cresci sem maiores sequelas na cabeça ou no pé. Agora é hora de imaginariamente encher o porta-malas e partir para o Caribe, quer dizer, Navegantes.