A culpa é desses maconhados sem-vergonhas

Maconhado é, sem dúvida nenhuma, um superlativo. Maconheiro é adjetivo pejorativo miúdo. Coisa de “estudante universitário”. Se o sujeito for preconceituoso como parte da minha parentada, por exemplo, vai completar a frase com um típico “de humanas”, depois vai soltar uma risada. Já o maconhado não tem mais jeito. Transcende o mero fumar maconha. É alguém possuído, um meliante, um destruidor da moral e dos bons costumes.
Tenho um tio, do tipo que gosta de beber, cozinhar (metido a gourmet) e falar mal dos outros, que vive na varanda a olhar para a rua e não hesita em rotular os pobres transeuntes de maconhados. Segundo ele, o mundo está perdido. Tudo culpa, lógico, dos maconhados.
Comer na casa dele é aguentar a televisão no volume máximo em algum programa sensacionalista recheado de gente que matou gente. Você mastiga o pão ouvindo o apresentador tendo um ataque de cólera, pedindo para “botar o vagabundo na tela”. Meu tio vai ao delírio, parece eu ao ver o Avaí fazer um gol. Ele abre os braços, gesticula, aponta o dedo para tela e sentencia “tá vendo, tá vendo, eu disse, é maconhado!!!”
Quando seu candidato ganhou a eleição, ele chorou de alegria. Parecia que tínhamos ganhado a Copa do Mundo. Dormiu abraçado ao seu trinta e oito de estimação, pois agora, como me disse, os maconhados seriam escorraçados de vez do planeta.
Meu tio é também um anticomunista, porque comunista é (em negrito) maconhado. Karl Marx foi maconhado (ponto de exclamação proposital)! Lenin foi maconhado! Chomsky ele não conhece, mas eu, seguindo o seu pensamento, sei que tenho a autorização para, em seu nome, dizer: é Maconhado! Frei Betto, Leonardo Boff, Madonna, tudo, mas tudo mesmo… Maconhado! Manuela D´ávila, uma maconhada igual a Dilma. E o Lula? tá na cara meu… Maconhadasso, por isso que tá na cadeia, babaca!
Meu tio, por sorte, não tem Facebook nem navega pela internet, recebe somente as verdades proferidas pelos grupos de Whatsapp. Quando, pelo telefone, fala comigo sobre política, eu fico quieto, mudo de assunto, pergunto se o Floresta ganhou do Vera Cruz. Mas ele é insistente. Chega um momento em que eu peço para conversarmos sobre outra coisa, então vem algo do tipo “E aí Petson, muito maconhado na Alemanha?”
Eu confesso, tenho vontade de chorar. Ontem liguei para ele e contei que estou indo para o Brasil. Ficou felicíssimo, me pediu até uns presentes. Perguntei o que ele queria… Ah, respondeu ele, uns chás, chocolate e sei lá, algo para a cozinha…
Hoje, rodei meio estado, só para conseguir os tais produtos. Estou aqui na esperança que o meu tiozão sessentão, direitista e cidadão de bem aprecie os presentes.

Chá
Chocolate
óleo de cozinha